Acredito ser este assunto tão importante e comum em nosso meio, que não poderia de registrar esta excelente entrevista nas partes que nos pode afetar diretamente nas finanças pessoais. Retirei a parte que falava do tratamento farmacólógico que não é um tema que deva ser abordado aqui, Minha intenção foi apenas compartilhar com os leitores, um pouco de conhecimento do que é um comportamento normal e um compulsivo, diferenciando-os, de forma a entender sua aplicação e resultados em nosso cotidiano financeiro.
O consumismo é uma das piores pragas atuais da sociedade, que através das midias e apelos de todos os tipos, afetam o comportamento financeiro de grande parte da população que se tornarão os futuros endividados e negativados, os quais infelizmente, tem uma taxa altissima em nosso meio. Mas temos que diferenciar o que é fruto de um mal hábito e o que seria uma patologia propriamente dita, que sempre deverá ser abordado por um profissional da medicina psiquiátrica ou da psicologia.
"Muita gente imagina que os comportamentos compulsivos estão apenas
associados a drogas como álcool, maconha, cocaína e nicotina, por
exemplo. De fato, dependentes de droga manifestam esse tipo de
comportamento, mas a compulsão não está relacionada exclusivamente com o
uso de substâncias químicas. Pode estar ligada a outras situações que
provocam prazer, como fazer compras ou passar horas em frente do
computador. Quem não conhece pessoas que compram compulsivamente,
estouram o limite do cartão de crédito, do cheque especial e a conta no
banco de uma forma deletéria para si mesmas. Quem não tem notícia de
gente que permanece horas em frente do computador e se esquece de comer,
de falar com os amigos, de prestar atenção nos filhos. Esses
comportamentos, tanto quanto os relacionados com o uso de drogas,
interferem com o mecanismo de prazer e podem adquirir características
patológicas, de certa forma incontroláveis."
Vamos à entevista ( focando no comportamento financeiro somente) :
CARACTERÍSTICAS DO COMPORTAMENTO COMPULSIVO
Drauzio - Quais são as características básicas do comportamento compulsivo?
André Malbergier -
O comportamento compulsivo se caracteriza por uma pressão interna que,
em determinadas situações, faz com que a pessoa se sinta impelida,
tomada por desejo muito forte de realizar uma ação que gera prazer
principalmente nos estágios iniciais, mas que depois provoca sentimento
de culpa e mal-estar.
Drauzio - Vamos
pegar o exemplo das compras. Como se distingue um comportamento
patológico do comportamento normal da pessoa que vai às compras?
André Malbergier -
Com base em estudos americanos, o comprar compulsivo só passou a ser
tratado como doença recentemente. Considera-se que uma pessoa é
compradora compulsiva quando, em determinado momento, começa a
contabilizar prejuízos financeiros, pessoais e de relacionamento
provocados pelo descontrole nas compras. Embora as pesquisas mostrem que
quase todo o mundo, de vez em quando, compra por impulso, porque
comprar por impulso faz parte da natureza humana, o comprador compulsivo
não cede a essa pressão eventualmente. Cede sempre, em especial se
estiver dominado por sentimentos negativos, entristecido, com baixa
autoestima e dificuldade de relacionamento. Em geral, são mulheres que
vão ao shopping e começam a comprar sem controle. Às vezes, saem de
casa pensando em adquirir determinado produto, mas entram nas lojas e
não resistem ao apelo de comprar outras coisas. O interessante é que não
compram só para si. Se a abordagem do vendedor for eficiente, sairão da
loja carregadas de presentes e, quando alguém reclama que estão
gastando muito dinheiro, argumentam “Não seja ingrato. Você se esquece
de quantos presentes lhe comprei”.
Na verdade, os shoppings
favorecem esse tipo de comportamento pelo número e diversidade de lojas
que oferecem agrupadas num mesmo espaço. Além disso, contar com cartões
de crédito e poder parcelar os pagamentos funcionam como atração e
incentivo para novas compras.
COMPULSÃO NOS DOIS SEXOS
Drauzio - Esse tipo de compulsão é mais frequente nas mulheres?
André Malbergier -
Observa-se que de 90% a 95% dos compradores compulsivos são mulheres.
Alguns estudos mostram que elas têm a chamada dependência de shopping
center, caracterizada por problemas com compras, com comida e
cleptomania, uma vez que também fazem pequenos furtos. Os comportamentos
compulsivos dos homens estão mais ligados à adição de álcool, de drogas
e ao sexo. Essa diferença provavelmente pode ser atribuída a aspectos
culturais, pois biologicamente não teríamos como explicá-la, já que toda
a ação ou fisiopatologia da doença está associada ao circuito da
recompensa que, em teoria, é igual nos dois sexos.
Por outro lado,
vários países que estudam o comportamento dos adolescentes no que se
refere ao uso de drogas lícitas ou ilícitas verificaram que, nesse
campo, o comportamento de homens e mulheres está ficando muito parecido,
o que pode reforçar a hipótese de tratar-se de uma questão mais
cultural do que propriamente biológica.
CIRCUITO CEREBRAL DE RECOMPENSA
Drauzio - Você
está chateado, entra num shopping, compra uma camisa e uma gravata
bonita e fica um pouco mais feliz. Como funciona o mecanismo de
recompensa nesses momentos?
André Malbergier
– Já está demonstrado que existe no nosso cérebro um circuito de
recompensa, na verdade uma estrutura bastante rudimentar que, de alguma
forma, está presente também nos outros animais, por exemplo, nos ratos, e
que vai mediar nossa relação com situações de prazer, como fazer sexo,
ir às compras, comer uma comida gostosa ou encontrar uma pessoa querida
que não víamos há muito tempo. Sabe-se também que, dependendo do grau de
prazer que determinada situação gerou, esse circuito é estimulado em
diferentes níveis. Certos comportamentos e algumas substâncias conseguem
fazê-lo de uma maneira que dificilmente seria possível ocorrer na vida
cotidiana. É muito difícil dimensionar o grau de prazer experimentado
pelos dependentes se o compararmos com o de uma pessoa comum. Talvez
seja isso que, depois de algum tempo, os faça declarar que nada mais
lhes traz prazer além do sexo, da cocaína ou das compras, por exemplo.
Existe uma alteração no cérebro ligada à liberação de um
neurotransmissor chamado dopamina, que é responsável pela sensação de
prazer. Ele faz com que a pessoa, por susceptibilidade biológica ou
sociocultural, ao entrar em contato com determinado comportamento ou
substância, associe tal estímulo ao prazer e bem-estar que está sentindo
e que foi provocado pela maior liberação desse neurotransmissor. No
entanto, quando se repete muito tal comportamento ou o uso da droga, a
ação da dopamina se esgota, se esvazia rapidamente, a pessoa se sente
mal e precisa repetir com mais frequência o estímulo externo para manter
minimamente os níveis de dopamina no sistema cerebral de recompensa.
Drauzio - Quer
dizer que os compradores compulsivos estabelecem uma ligação patológica
entre determinado comportamento e os níveis de dopamina. Provocam o
estímulo, porque só ele consegue fazer com que sintam felizes naquela
hora, pelo menos. Com a cocaína, acontece a mesma coisa. Quando cessa
sua ação, o usuário fica derrubado e repete a dose, mesmo sabendo que
aquele comportamento é deletério. A pessoa que vai fazer compras sabe
que depois vai sentir-se mal?
André Malbergier -
Sabe, sim. O interessante é que só recentemente se conseguiu demonstrar
que não são apenas as substâncias químicas que atuam nos circuitos
cerebrais da recompensa. Compras, jogos patológicos, sexo, comida ou
mesmo o uso exagerado do computador representam comportamentos capazes
de agir sobre eles. No caso do comprador compulsivo, o fenômeno é muito
parecido com o provocado pelas drogas. A pessoa se ilude com a sensação
de que vai ao shopping não para comprar, mas para ver vitrines, ir ao
cinema ou levar o filho. Como o usuário de cocaína que acha que pode ir a
uma festa, mas jura que não vai usar drogas ou vai usar só um
pouquinho, ela fica brigando consigo mesma – “Vou conseguir frequentar o
shopping sem me endividar” -, mas não resiste sequer ao primeiro apelo.
Os
comportamentos compulsivos são estimulados pela facilidade de acesso à
substância, no caso, o acesso às compras. Do mesmo jeito que numa festa a
simples visão da cocaína pode liberar desejo incontrolável ou fissura,
exposta a uma situação de compra, a pessoa tem as mesmas reações.
FATORES DE RISCO
Drauzio - Existem
pessoas que correm maior risco de desenvolver comportamento compulsivo
em relação às compras? Há um tipo de personalidade ou de educação mais
comum nelas. Por exemplo, pais que compram mais presentes para os filhos
podem estar incentivando esse tipo de comportamento?
André Malbergier -
Teoricamente, quem corre maior risco são as mulheres de classe média ou
média alta, faixa socioeconômica com maior disponibilidade de dinheiro
para gastar. Pagas as contas do dia a dia, sobra-lhes sempre uma quantia
para ser usada em recreação, lazer, compras, etc. Discute-se se boa
parte dessas mulheres são filhas de pais que trabalhavam muito e ficavam
ausentes por longos períodos, deixando em suas mãos, quando meninas,
dinheiro disponível precocemente. Assim, aos 16 ou 17 anos, idade em que
começaram a sair sozinhas, criaram hábitos, entre eles o de compras,
que incluem gastos excessivos.
COMORBIDADES
Drauzio -
Compradores compulsivos podem apresentar o que em medicina se chama de
comorbidade, ou seja, a associação com outras patologias psiquiátricas?
Por exemplo, existem pessoas deprimidas que são dependentes de álcool.
Quando se vai analisar o caso, descobre-se que o alcoolismo surgiu como
tentativa para fugir da depressão.
André Malbergier -
Na área da dependência e compulsão são comuns os casos de comorbidade.
Estudos mostram que de 60% a 70% das mulheres com compulsão por compras
apresentam sintomas depressivos e número um pouco menor, depressão
clínica propriamente dita. Outra doença frequentemente associada aos
compradores compulsivos é a distimia, uma depressão crônica mais leve do
que a depressão clínica. É evidente que pessoas com sintomas
depressivos, às vezes por anos, quando descobrem que o fato de irem às
lojas para fazer compras melhora seu ânimo, desenvolvem compulsão nem
tanto pelo prazer de possuir um objeto em si, mas porque são paparicadas
pelo vendedor dentro de uma loja bonita e num ambiente agradável. O
bem-estar que sentem nesses momentos é descrito quase como um orgasmo.
Interessante é que muitas, mal saem da loja, começam a cair na real e
veem que deram mais um cheque ou assumiram mais uma dívida no cartão de
crédito e não levam os objetos que adquiriram para casa ou, se levam,
escondem-no do marido (a maioria é casada) ou não desfazem os pacotes.

Drauzio - Em que faixa etária é mais comum esse tipo de problema?
André Malbergier -
Em geral, na faixa dos 39, 40 anos, quando os maridos atingiram certa
estabilidade financeira. As feministas não gostam dessa interpretação.
Dizem que hoje em dia as mulheres trabalham e ganham dinheiro para arcar
com as despesas e os pagamentos de suas compras.
OBS: Texto parcialmente retirado de http://drauziovarella.com.br/drauzio
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